terça-feira, 20 de março de 2007

Senhora das Tempestades





Eu pescador que pesco por um instinto antigo

e procuro não sei se o peixe se o desconhecido

e lanço e recolho a linha e tantas vezes digo

sem o saber o nome proibido.


Eu que de cana em punho escrevo o inesperado

e leio na corrente o poema de Heraclito

ou talvez o segredo irrevelado

que nunca em nenhum livro será escrito.


Eu pescador que tantas vezes faço

a mim mesmo a pergunta de Elsenor

e quais águas que passam sei que passo

sem saber a resposta. Eu pescador.


Ou pecador que junto ao mar me purifico

lançando e recolhendo a linha e olhando alerta

o infinito e o finito e tantas vezes fico

como o último homem na praia deserta.


Eu pescador de cana e de caneta

que busco o peixe o verso o número revelador

e tantas vezes sou o último do planeta

de pé a perguntar. Eu pescador.


Eu pecador que nunca me confesso

senão pescando o que se vê e não se vê

e mais que peixe quero aquele verso

que me responda ao quando ao quem ao quê.


Eu pescador que trago em mim as tábuas

da lua e das marés e o último rumor

de um nome que alguém escreve sobre as águas

e nunca se repete. Eu pescador.


Manuel Alegre

Um comentário:

Manuel Marques disse...

É delicioso o que andas a fazer com este blog! Abraços e abraços sem fim!